Entrevista com Ícaro Gomes

Jornalista e especialista em Educação

Para essa edição consegui uma entrevista interessante não somente à região do salgado paraense, por onde é bem presente em suas atividades de comunicação e política, mas também à região metropolitana da grande Belém de onde é nativo.

Gerson Ícaro Gomes, especialista em educação e comunicação social, nasceu em Castanhal, porque na época a maternidade do Povo – já extinta – era o que havia de acolhedor para nascimento de crianças na região, mas, com poucos dias de nascido já estava em Marituba, já que seu pai Veríssimo – o Seu Mimito – era um caboclo da borracha e trabalhou na extinta plantação de seringa na multinacional Goodyear em São Francisco do Pará e depois na Pirelli em Marituba.

É casado com a professora de Letras do estado e advogada Fernanda Cristo, tem duas filhas – Gevla e Maevla do primeiro casamento e o José Veríssimo – que herdou o nome de seu pai - com a Fernanda, onde ressalta: “Num casamento maravilhoso de 16 anos!”.

Questionado sobre período de seu pai, Ícaro Gomes disse:

Vivenciei muito aquelas cuinhas de plásticos de coletar látex. Sou filho de dona Peta, uma das primeiras tacacazeiras da terra dos Umaris, sua banquinha de tacacá ficava no canto do saudoso Dico Moreira, na antiga Rua da Assembleia, hoje Travessa Primeiro de Maio, bem na ilharga da segunda rua – a Claudio Barbosa.

Conte sobre a Marituba de sua infância, do período que esteve por aqui?

Marituba era um distrito de Ananindeua, bem na fronteira com Benevides com o charmoso Decouville, ainda tinha resquícios muito evidentes de vila operária, a estrada de Ferro Belém-Bragança havia sido desativada e os trilhos e dormentes eram recolhidos para venda. A vila era bucólica, cheia de caudalosos igarapés – Prainha, Caxias, do Tubo, o da Mata – meu preferido, onde mamãe lavava roupa e a gente brincava e almoçava farofa de charque – entre outros. A cultura pulsava forte, tinha bois e pássaros, festivais de música, TVs em preto e branco nas casas e radinhos de pilha. Com a década de 80, a juventude ganhou notoriedade, peças de teatro do grupo Raízes; o futebol disputado entre Flamengo e Marituba; festas por todos os lados e o Mangueirão do Samba; o bar Edlanche do Naldo Bastos era o point; na praça os banquinhos de pedra do querido Fernando Correa bem talhados para as noitadas regadas à cachaça e boa música no violão do Léo. Estive entre os primeiros filhos de gente simples a ingressar na universidade federal. Na escola Fernando Ferrari a política estudantil pulsava no Grêmio Livre, e a educação era garantida por uma constelação de professores – Vicente, Orlando Tadeu, Jonas, Luzia Freire, Adilson, Josabeth, Lázaro, Rubenildo, Leal, Vevé, Antônio Falcão e outros talentos.

O que significa Marituba para você?

Marituba é uma paixão, uma vivência maravilhosa de uma época sem cemitérios parques, complexo penitenciário e lixão. Era pura conexão com a natureza, a gente ia para debaixo da ponte do Oriboca, onde até chegou a funcionar um “arremedo” de bar. A gente tomava umas “canas” no Ozéias e conhecia todo mundo. Às vezes a gente ia para o seu Zezé tomar uma cerveja que era barata. Uma vila bem tranquila em que reinava pureza e simpatia. Seu Zé Piranha dava uma volta na Praça Matriz à meia-noite sem ser incomodado. Minha família tem raízes evangélicas e ainda tive a fase fantástica de Assembleia de Deus do saudoso pastor Artur Piedade, rigoroso, porém simpático e gentil, num tempo em que não havia o mercado da fé. Tinha escola bíblica de férias com alegria. Na antiga Colônia de Marituba aprendi uma série de valores como solidariedade, resiliência e amor. Lá eu frequentava a biblioteca, participava por meio do Interact Club do Fernando Ferrari de campanhas de vacinação. Por outro lado, quis empreender e ao lado do saudoso Augusto Amaral, do Jece Cardoso e do Tonico, foi criado o Centro de Estudos Gerais Elaborados – o famoso CEGEL, lá na década de 80, e que foi tão bem continuado pelo José Augusto Amaral anos depois. A gente ia de pick up C 10 para Mosqueiro com o ‘Cunhado Zé Júlio’, um dos grandes nomes da política maritubense, ao lado de talentosos como Paulo Afonso de Oliveira Falcão, o Poli, o Lázaro Falcão, Fernando Corrêa, Naldo Bastos e Antônio Armando.

Sua saída de Marituba e suas experiências fora?

Pois é, desde esta época a situação de emprego já era precária em nossa terra, desde então a vila já servia de dormitório, pois a grande maioria precisa sair na BR e ir trabalhar na capital. Então, chegou a hora de voar e fiz e tenho feito muita coisa, servi como bancário em Paragominas, servi como secretário de gabinete, de finanças da Prefeitura de Salinópolis, fui diretor legislativo na Câmara Municipal de Salinas; servi como secretário na pasta de finanças e depois na educação da minha amada Maracanã e também com secretário de administração em Santa Luzia do Pará. Na educação já servi em muitas paragens – como Tracuateua, Ponta de Pedras, São João de Pirabas, Capanema e por ai vai...

Quando e por que entrou no jornalismo, como isso começou?

Começou em Salinópolis na década de 90, apresentamos para a sociedade o jornal impresso “O Litoral” que seguiu firme por anos, depois veio o Vento do Litoral e sempre me dedicando a opinar, registrar fatos, a história e memória da região Nordeste Atlântica do Pará.

Conte sobre suas experiências por outros municípios que você já passou atuando como jornalista.

Depois que cheguei a Maracanã, no ano de 2005, construí grandes amizades, tendo inclusive disputado a eleição de 2012 à Prefeitura da cidade. Além de amar textos e o jornalismo, aventuro-me compondo músicas, gosto de fotografia, enfim, um pouco de tudo. Em 2010 nasceu o Blog Icaro Gomes, que agora se transformou num Portal que retrata a história e os fatos da região, talvez um dos mais longevos e resistentes do Pará.

Fale mais sobre o Blog e a mudança para Portal.

No início a gente registrava mais sobre política, tenho uma coluna que vem acompanhando a existência do Blog, hoje reproduzida no jornal A Nova Folha, chamada Diga-se de Passagem, são várias noticias em um só local reproduzidas em notinhas. Então, foram nascendo as coisas, vem a coluna Travessia que é um tipo de obituário da região, onde contamos histórias de pessoas ilustres e simples que fazem sua travessia para o andar superior. Por outro lado, a Galeria Vip, uma estilosa coluna que remete aos tempos do colunista Isaac Soares, que registra gente, gosto de publicar gente, de todas as tribos, para gente o que importa são pessoas. E veio o Portal em 2025, uma transição que vem sendo feita, trilhamos pelos esportes, por postagens policiais, turismo, educação, saúde, história e memória, fotografia, meio ambiente e sustentabilidade, enfim: melhoramos!

Vamos falar um pouco sobre política, e como vês a conjuntura desta às eleições do estado, já que você conhece a política do interior?

A coisa vai ser quente ano que vem, teremos seguramente uma das mais disputadas eleições dos últimos tempos, quem sabe para relembrar os embates de Jader Barbalho e Xerfan ou mesmo Almir Gabriel e Jarbas Passarinho da década de 90. Helder tem o maior grupo político formado nas duas últimas gerações, muitos prefeitos, lideranças importantes, os maiores partidos aliados, porém, não tem 30% - não levem para outras coisas – da desenvoltura política de seu pai Jader Barbalho – a liderança mais longeva da história do Pará e que exerceu importantes cargos na república. Helder não tem o respeito que seu pai tinha pelas lideranças, é presente teoricamente com o povo, mas, talvez seu ego o atrapalhe. Por outro lado, temos Dr. Daniel, o prefeito de Ananindeua que está sabendo captar a insatisfação que existe com os Barbalhos. No interior, as pessoas estão meio que indigestas, percebem que a família quer tudo, um exemplo é a composição do secretariado, parece que não tem pessoas capacitadas no interior, tudo precisa ser da capital. Não é o nome do Daniel, poderia ser outro, mas Daniel é menino “maluvido” e foi o que teve coragem de se contrapor, hoje circula bem no meio do movimento bolsonarista, no movimento da esquerda insatisfeita e no meio daqueles – e são muitos – que foram preteridos no ano passado, quando Helder distribuiu o MDB para prefeitos, inclusive, pra muitos que nunca estarão no palanque dele em 2026. Ano que vem se ocorrer o que sentimos no interior, haverá muita debandada. A eleição promete. “Juro pela fé da mucura” que não tenho coragem de apostar uma garrafa de vinho Nobre no resultado da eleição de 26.

Como avalias a política em Marituba?

Marituba representa muito do que é o Pará, uma mistura de gente, de sotaques, de culturas. Lembro que no passado a gente tinha vizinho cearense, maranhense e todos sempre se respeitaram, assim ainda é hoje. A cidade cresceu e é formada por todos os povos, um lugar que acolhe o povo que vem do interior na busca de emprego na capital e se instala por aqui porque é mais barato o imóvel, o aluguel. Valorizo demais os filhos de Marituba, acho que precisam estar mais presentes politicamente, mas vejo com bons olhos o fato de termos uma prefeita nascida no nordeste do Brasil, isso representa o que somos, uma mistura maravilhosa. Apesar que a atual tem o melhor time de mídia do Pará, os que falam por ela, bem diferente do time escalado para a gestão, que deixa muito à desejar. Agora não se pode falar em política em Marituba sem buscar o passado, nossos maiores nomes continuam sendo Poli e Fernando Correa. Imagine, Seu Fernando que foi vereador em Ananindeua com votos de Marituba e depois se elegeu prefeito de uma cidade gigante. Nunca andou de carrão, sempre em carro simples – na maior parte de sua vida num velho Gol e até mesmo de bicicleta. Sempre residiu no mesmo lugar e sua vocação de relojoeiro do mercado o acompanhou na vida. Prefeito duas vezes e em cidades diferentes, nunca teve um bangalô como as afrontosas casas de condomínios de hoje. Seu Fernando conseguiu fazer mais ainda se elegeu o primeiro prefeito de Marituba já cidade, e quando não tinha prédio da prefeitura, não tinha a cadeira de prefeito, nenhuma caneta, não recebeu uma folha de papel, não havia uma caçamba, uma motocicleta, quando nem se falava em caminhão de lixo. Começou do zero e encarou. Hoje ainda falta muito – saneamento, saúde, educação, segurança e tudo que quem mora sabe muito melhor do que eu. O transporte público é o mesmo dos últimos 40 anos, o povo continua andando igual “sardinha” e no calor desde a viação Moderna.

Suas considerações finais.

Viva Marituba, Marituba é maravilhosa e aos filhos de nossa terra deixo um recadinho de fácil entendimento: Marituba pode muito mais! Prezo muito lideranças como o Gordo, o Besteiro, o Naldo, o Boni, o Jece, o Bruno, o Antônio Armando Júnior, que conhecem profundamente o que é a cidade e seus problemas, por isso têm uma responsabilidade política maior ainda em se apresentar ao povo com coragem. Vejo também com alegria as novas lideranças surgidas que estão no meio do povo, nas redes sociais e na Câmara, enfim. Só não se pode esquecer que a política não se faz mais dentro das casas conversando, as redes sociais são as ferramentas mais importantes para o eleitor avaliar se você realmente defende aquilo que diz e a prefeita é o maior exemplo.

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Jece Cardoso

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